terça-feira, 11 de outubro de 2011

Absolvição é contestada


Entidades de defesa dos direitos humanos protestam contra decisão judicial que beneficiou Luiz Sefer
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), por meio de sua Regional Norte 2, e entidades de defesa dos direitos humanos protestaram, ontem à tarde, contra a absolvição do ex-deputado Luiz Sefer, que, por dois votos a um, foi inocentado, pela 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, da acusação de estupro. Segundo as entidades, a decisão judicial deixou o "Pará de luto e representou um retrocesso no enfrentamento" a esse tipo de crime.
Em coletiva à imprensa, a senadora Marinor Brito (PSOL) afirmou que a absolvição de Sefer foi "negociada". "Há várias formas de negociar. Não sabemos o preço de cada sentença. Conhecemos casos de juízes no Pará que foram afastados por vender sentenças. Não é a primeira vez que, infelizmente, acontece". Marinor Brito disse ainda que a ministra Eliana Calmon, corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), "tem razão quando diz que tem muito bandido de toga". Segundo a senadora, "uma parte significativa da Justiça tem inocentado bandidos". "O Pará é campeão de mortes no campo, de trabalho escravo, de violação dos direitos sexuais de crianças e adolescentes. Nos envergonhamos de uma Justiça que tem incentivado esse tipo de violência, deixando crianças e adolescentes vulneráveis, nas mãos de bandidos, criminosos e traficantes", completou.
Sobre a absolvição do ex-deputado, Marinor argumentou que "faltou responsabilidade social, cumprimento da lei, tratamento justo ao caso, que é absolutamente estruturado de elementos que facilitariam a condenação em qualquer instância da Justiça". Ainda de acordo com ela, o processo foi julgado na "calada da noite", na véspera do Círio e sem o conhecimento da sociedade. Ela informou que, no próximo dia 21, às 11 horas, as entidades terão uma audiência com a presidente do Tribunal de Justiça do Estado, Raimunda Noronha, a quem irão solicitar que "tome as providências de forma célere, como o Tribunal tomou agora para julgar o processo que inocentou este criminoso, que viola direitos sexuais de crianças e adolescentes". "Temos provas substanciais e, por isso, podemos dizer que ele é um pedófilo", completou.
Marinor disse que o Ministério Público do Estado está preparando recurso contra a decisão do Poder Judiciário, que será assinado por vários promotores de Justiça. Esse recurso será impetrado no Superior Tribunal de Justiça.
Ex-deputado afirma que adversários políticos se beneficiaram
Logo após a coletiva, Luiz Sefer também reuniu a imprensa e se disse vítima de calúnia. "Foi feita Justiça de verdade agora. Havia dois lados nesse julgamento. O meu e o dos meus caluniadores. Com minha absolvição, eles foram condenados", completou. Ele classificou como "quadrilha" o grupo formado por todos aqueles que querem prejudicá-lo.
O ex-deputado disse ainda que foi "execrado em praça pública". "A minha família sofreu um inferno e não tive direito ao que estou tendo agora, ou seja, ao contraditório, direito a voz. Tudo no processo mostra a calúnia bárbara que fizeram contra nós. O Pará está de luto? O Pará se ressurgiu, porque a Justiça não se submeteu à pressão política nem à pressão da mídia", afirmou.
Assim como disse na entrevista publicada na sexta-feira passada por este jornal, Sefer afirmou que "tudo não passou de armação política". Segundo ele, o deputado federal Arnaldo Jordy e a senadora Marinor Brito se beneficiaram ao atacá-lo.
Sefer desafiou Jordy a mostrar o processo que o parlamentar informou que ele responde na Paraíba: "Que ele diga qual o processo, qual é a pessoa". Classificou ainda como "doidice e irresponsabilidade" a informação, também dada por Jordy, de que pagou R$ 6 milhões ao advogado Márcio Thomaz Bastos. Aos jornalistas, disse: "Vai ver a ficha limpa do Jordy. Vai ver". Em outro momento, citou um fato que ocorreu em Maracanã, envolvendo o deputado Jordy, mas não entrou em detalhes. "Esse cidadão representa o povo e enganou 200 mil pessoas. Está na hora de parar com esse comportamento irresponsável, caluniador, de ódio. Perderam e acabou".
Luiz Sefer disse que vai processar todos aqueles que o caluniaram. "Quero pegar um a um. Vou processar todos os que participam dessa quadrilha. Não com ódio e rancor, mas com firmeza e serenidade". Ele afirmou que, agora, sairá de férias, para poder se recompor e, depois, reordenar sua vida. Ele ainda não decidiu se, ano que vem, se candidatará novamente.
Militante fala em "retrocesso da justiça"
Nazaré Sá, do Fórum Estadual da Criança e do Adolescente, disse que a absolvição do ex-deputado foi um "retrocesso da Justiça". "Pra que servem a lei e a Justiça?", questionou. Presidente da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH), Marco Apolo disse que o resultado do processo "deixou a todos indignados. Envergonha todo o povo paraense. Não é à toa que o Poder Judiciário paraense tem uma péssima reputação em todo o País", afirmou.
Em nota, a Regional Norte 2, da CNBB, diz que o Tribunal de Justiça do Pará, com essa decisão, "feriu os direitos de todas as vítimas de abuso sexual, que só possuem como provas suas palavras e as lembranças do horror que sofreram".
"Manifestamos nossa indignação com mais esta decisão da Justiça do Pará. A impunidade, neste Estado, é comandada por aqueles que detêm poder político e econômico. Essa é a imagem que se configurou com a absolvição do ex-deputado Luiz Sefer", diz ainda a nota, assinada pela secretária-executiva da entidade, Orlanda Alves.
Arnaldo Jordy diz que processo semelhante existe na Paraíba
O deputado federal Arnaldo Jordy disse que Luiz Sefer é acusado do mesmo crime na Paraíba, mas que o processo corre em segredo de Justiça naquele Estado. Ele informou que essa informação lhe foi repassada pelo senador Magno Malta (PR), quando este presidia a CPI Nacional da Pedofilia. "Esse fato não é do conhecimento da opinião pública porque corre em segredo de Justiça, mas muitos dos nossos desembargadores têm conhecimento disso", afirmou Jordy.
Ele disse ainda que "aconteceram coisas estranhíssimas" no julgamento do ex-deputado, na quinta-feira passada. "Primeiro, a data em que foi marcado (o julgamento), quando todos os paraenses fazem sua devoção à nossa padroeira, momento em que as pessoas praticamente abandonam suas agendas, de qualquer natureza, para viver o Círio". Ele também apontou a celeridade do julgamento. "Foi publicado no Diário Oficial (da Justiça) hoje para a sessão de julgamento ser amanhã, pegando todos quase de surpresa". "Outro ato muito estranho foi a ausência de sustentação oral do Ministério Público. Um caso notório, de repercussão nacional, em que o Ministério Público, que é o autor da acusação, abdica da sustentação oral da acusação. São coisas estranhas no enredo do julgamento", completou.
Arnaldo Jordy disse respeitar a decisão do Poder Judiciário, mas a classificou como "lamentável, que agride todo o esforço que a sociedade paraense, e brasileira, vem tendo nos últimos anos no sentido de enfrentar esse crime hediondo praticado contra seres indefesos, contra crianças e bebês. Foram mais de 100 mil casos nos últimos cinco anos", disse, citando dados da CPI da Pedofilia, da Assembleia Legislativa do Pará.

Nenhum comentário:

Postar um comentário